O italiano de Dolceaqua
Sem sombra de dúvida,
o Brasil deve muito do ensino e realização de obras musivas a um número incontável de artistas italianos que se fixou em nosso
país. Dentre todos que por aqui passaram o nome de Franco Giglio é um dos que melhor possui registro e memória conservados
de sua vida e obra. A dimensão desse acervo seria ainda maior se não fosse o incêndio que destruiu seu ateliê em Verona na
Itália em janeiro de 1979 consumindo centenas de obras, grande parte delas realizada no Brasil.
Giglio nasceu em Dolceacqua,
na Itália, em 1937, vindo para o Brasil aos 21 anos. Sem formação acadêmica, começou a trabalhar com outro italiano, Antônio
Mucci, estabelecido em Minas, que, entre uma infinidade de obras musivas, legou o único livro escrito até hoje sobre mosaico
no Brasil: Compêndio Histórico-técnico de Arte Musiva, publicado pela Editora Ao Livro Técnico em 1962, esgotado há muito tempo.
Ao final dos anos 50,
Mucci fora convidado a realizar o painel A Evolução da Moeda através dos Tempos, na cidade de Juiz de Fora obra que permanece bem preservada, no prédio da Secretaria Estadual de Fazenda, antigo edifício do Banco
Mineiro da Produção em mosaico de pastilhas cerâmicas com recobrimento vítreo. Convidou Giglio para acompanhá-lo na empreitada.
O filho de Dolceacqua aprendeu a técnica e não mais a deixou, passando a exercê-la em Curitiba, onde fixou residência e ateliê.
Franco Giglio tornou-se
muralista, tendo realizado trabalhos em mosaicos para o Cemitério de Curitiba (que passaram por restauração recente), para
a Assembléia Legislativa do Paraná, para o Colégio Lins de Vasconcelos e para outros prédios públicos e residências particulares.
De grande afabilidade, fez um círculo de amigos fiéis entre os artistas paranaenses. Poty Lazarotto confiou a ele a realização
de um de seus painéis em azulejos mais vistosos, o Monumento ao Tropeiro, e insistiu com ele para abrir o porta-fólio e exibir seus desenhos. Em catálogo para uma exposição, em 1974, assim se expressa o amigo
Poty:
Afinal o enrustido
curitibano de "Dolceacqua" resolveu (Aleluia!) desenterrar o pescoço dos ombros e mostrar estes desenhos magníficos a mais
gente do que os vários privilegiados que tinham acesso ao seu apartamento ou atelier de cerâmica.
Dava pena ver tanto
desenho de tal qualidade espalhado por toda parte, feitos ao acaso sobre o primeiro pedaço de papel à mão, quadriculado, de
embrulho, o que fosse. E quantos sumiram...
Felizmente (é Aleluia!),
deu um estalo no cérebro do homem ou talvez tenha sido coisa longamente elaborada, e, através de um processo original e tortuoso
como é o do seu feitio, ele pôs-se a recuperar um a um, aqueles desenhos, (ressuscitados) nesta exposição, com surpreendente
clareza e vitalidade.
Alegria para
nós, os amigos, que sempre rogamos e esbravejamos por
ela, ao teimoso e excelente desenhista
que é Franco Giglio!
No ano seguinte,
1975, Giglio casa-se com Roseli de Almeida e retorna à sua querida Dolceacqua. Passa a residir em Mantova, depois em Verona
onde um incêndio devasta grande parte de seus antigos desenhos e vem a falecer precocemente em abril de 1982, aos 44 anos
de idade.
Como a obra
musiva que deixou tem grande visibilidade, não me seria difícil fotografar diversos painéis e murais realizados sobretudo
no Paraná, mas dificilmente eu conseguiria dados tão completos sobre sua vida como os que obtive no site www.francogiglio.com.br, que apresenta de forma didática e bem direta um panorama vasto de sua trajetória artística com testemunhos
de críticos e dos muitos amigos que deixou em Curitiba. Vale a pena visitá-lo.